30 anos de Constituição Federal: a complexidade do sistema tributário brasileiro em números e cifras


Empreender. Na teoria, uma palavra que remete à conquista de sonhos, crescimento profissional e novas possibilidades financeiras. No Brasil, a prática não soa tão agradável quanto a teoria – pode-se dizer que passa muito distante -, e os empreendedores encontram barreiras significativas no processo de criação e manutenção de seus negócios.
 
Entre as principais barreiras, o sistema tributário é indiscutivelmente um dos maiores empecilhos. De fato, a realidade pode ser muito bem traduzida através de números: para se manter em dia com as suas obrigações no país, uma empresa deve obedecer mais de 4 mil normas tributárias – isto se não operar em mais de um estado; caso o faça, a quantidade com certeza tende a ser maior.
 
Os números foram apresentados na pesquisa “Quantidade de normas editadas no Brasil: 30 anos da Constituição Federal de 1988“, estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) e divulgado em setembro deste ano.
 
Na oportunidade, a pesquisa divulgou que, nos trinta anos de vigência da Constituição, foram editadas mais de 390 mil normas tributárias – uma média de 1,92 norma por hora (por dia útil). Ao todo, foram mais de 5,9 milhões de normas gerais elaboradas neste mesmo período.
 
Segundo o tributarista, contador, professor e Presidente Executivo do IBPT, João Eloi Olenike, a pesquisa mostra com eficiência como o número de normas tributárias pode prejudicar o ambiente corporativo no país. “[Tantas normas] acabam gerando um custo desnecessário às empresas, impedindo-as de se constituírem e conseguirem crescer”, argumenta.
 
Mário Sérgio Carraro Telles, gerente de Políticas Fiscais e Tributárias da Confederação Nacional da Indústria (CNI), acredita que o grande problema do sistema tributário não se encontra necessariamente no número de normas editadas, mas sim na complexidade destas. Além disso, defende que o crédito acumulado pelas mesmas é outra problemática.
 
“Nosso sistema tributário é complexo. Estima-se que cerca de R$ 90 bilhões de créditos pertencentes às empresas, oriundos de tributos, estejam acumulados sem que possam ser utilizados”, destaca o economista. “Sem falar no gasto das empresas para que se mantenham em dia com as normas e suas burocracias”.
 
O custo financeiro é, de fato, um grande empecilho. Segundo o estudo, as empresas brasileiras gastam mais de R$ 65 bilhões por ano apenas para seguir as regras tributárias e suas constantes alterações, seja com pessoal ou em investimentos tecnológicos.
 
Tais condições tendem a implicar, é claro, no insucesso. Só nos últimos três anos, mais de 341 mil empresas fecharam as portas no Brasil (dados do IBGE), levando consigo 3,7 milhões postos de trabalho, prejudicando a economia nacional e aumentando consideravelmente o desemprego.
 
Para Olenike, além de resultar em problemas financeiros às empresas, tais problemas acarretam também em transtornos jurídicos. “O excesso de legislação e má elaboração das normas leva constantemente a demandas judiciais ao Fisco por parte dos contribuintes”, justifica.
 
A afirmação do tributarista também pode ser comprovada através de números, desta vez apresentados no levantamento “Custo das empresas para litigar judicialmente: 2015 e 2016“, estudo realizado pelo escritório Amaral & Yazbek Advogados. Segundo o estudo, foram 7,7 milhões de ações na área tributária somente em 2016 – cerca de 11,9% dos casos judiciais envolvendo empresas.
 
Mas não somente o judiciário se vê sobrecarregado. Formado em Ciências Contábeis, Olenike também defende que o alto índice de normas afeta diretamente o trabalho dos contadores, profissionais essenciais para a saúde das empresas. “Prejudica [o contador] em relação ao tempo que tem de gastar para tomar conhecimento da legislação e interpretá-la”, destaca. “Tempo esse que ele poderia dedicar a outros assuntos com seus clientes”.
 
Para Olenike, há soluções a curto prazo para melhorar a realidade tributária do país e das empresas brasileiras. “O Brasil está entre os países do mundo onde há mais burocracia”, argumenta. “A solução seria um amplo estudo das normas existentes, para extinguir aquelas consideradas desnecessárias”.
 
Além disso, o presidente do IBPT também aconselha que sejam atribuídos limites ao poder legislativo. “Entendemos que a liberdade de se legislar, emanada da Constituição Federal de 1988, deve ser o motivo principal para tantas normas, sendo que quase todas as instituições da administração pública podem emitir normas”, esclarece. “Defendemos que uma das soluções seja limitar estes órgãos em relação a esse poder de legislar”.
 
Para Telles, a elaboração de uma reforma pode ser a chave para virar a história do sistema tributário brasileiro. “Somos (CNI) favoráveis à implantação de um Imposto de Valor Acumulado (IVA), por exemplo”, argumenta o gerente de Políticas Fiscais e Tributárias da entidade. “É um sistema adotado em países desenvolvidos e que dá certo. Os problemas tributários nestes países nem se comparam aos nossos, e um IVA certamente ajudaria a eliminar conflitos recorrentes destes aqui no Brasil”.
 
A ideia de um IVA vem ganhando cada vez mais força, sendo defendida por economistas que fazem parte da equipe de transição para o governo de Jair Bolsonaro. Para Olenike, a reforma tributária, tão requisitada por governantes e economistas, pode ser uma solução a altura; o contador e economista, porém, não destaca sua preferência na reformulação. “A Reforma deve ser um instrumento para que possamos simplificar o sistema tributário brasileiro”, defende. “Se aprovada pode diminuir o número de tributos e obrigações acessórias e, consequentemente, a quantidade de normas”.
 
Enquanto a reforma tributária não é de fato elaborada, apenas suposições acerca desta continuam sendo realidade. O fato é que, apesar de tão necessária, tal reforma precisa ser muito estudada antes de ser colocada em prática, uma vez que cada vez mais pessoas, físicas e jurídicas, se veem prejudicadas por um sistema complexo e extremamente burocrático. Como estaremos daqui outros 30 anos? Só o tempo dirá.
 
Fonte: Contabilidade na TV
 

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