Agropecuária não tem mais condições de salvar o PIB

A economia brasileira começou o ano com retração de 0,2%, considerando o resultado do primeiro trimestre comparado ao quarto trimestre de 2018. Preocupa o fato de a agropecuária, que em períodos de crise garante resultados positivos para o PIB, ter mostrado sinal de desgaste. O setor recuou 0,5% na comparação trimestral.

Segundo Flávio Teles de Menezes, ex-presidente e conselheiro da Sociedade Rural Brasileira, “o agronegócio não terá mais condições de contribuir com a economia como antes”. O setor, de acordo com ele, está trabalhando com margens muito apertadas.

“As margens estão praticamente zeradas para os produtores de soja. Ou seja, não vai sobrar dinheiro para ampliar a área plantada nas próximas safras. O mesmo acontece com a indústria sucroalcooleira, que não vai renovar o plantio”, disse Menezes nesta quinta-feira (30/05), durante reunião do Comitê de Avaliação da Conjuntura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), coordenado pelo conselheiro Edy Kogut.

Ele ponderou que esse quadro ainda não interrompeu o processo de desenvolvimento tecnológico, hoje envolvendo também médias empresas do setor que buscam ganhos de produtividade. As vendas de máquinas agrícolas, por exemplo, devem crescer 10% este ano.

A eficiência na produção é a salvação encontrada para contrabalancear a fraca demanda interna, especialmente por itens de maior valor, como laticínios e carne, segmentos que já registram queda nas vendas.

Embora a agropecuária responda por cerca de 6% do PIB, foi esse setor que em 2017 segurou praticamente sozinho o crescimento econômico de 1,1%, quando a safra de grãos cresceu 28,3%.

Já em 2018 o setor começou a mostrar sinais de enfraquecimento, com queda de 5,1% na safra, tendência reforçada agora pelo resultado trimestral do PIB.

A produção agropecuária sente os efeitos da retração do consumo causado pela crise econômica, que afeta emprego e renda. Um fenômeno observado por Menezes ajuda a entender a dimensão desse problema.

“Percebemos que muita gente que saiu do campo para buscar emprego na indústria e no comércio começa a fazer o movimento inverso agora. Mas no campo também não há emprego agora”, disse.

Nos últimos doze meses terminados em março o emprego avançou 1,8% e a renda, 1,4%. Apesar de positivos, os números não empolgam quando inseridos em um contexto de inflação de 4,93% e taxa básica de juros de 6,5%, em igual base de comparação.

Quanto ao mercado externo, Menezes disse que ainda há uma grande incógnita sobre os efeitos da guerra comercial entre Estados Unidos e China. Também há incertezas quanto às consequências do surto de peste suína africana na China, que tem levado ao abate forçado de milhões de animais.

A expectativa era por aumento das vendas de carne suína brasileira para os chineses, o que, segundo Menezes, não aconteceu, e queda nos embarques e preços da soja que é usada como ração animal, o que também não ocorreu ainda.

VAREJO

O consumo interno retraído também teve impacto direto no PIB do comércio, que recuou 0,1% na comparação entre o primeiro trimestre de 2019 e o quarto trimestre de 2018.

O índice de confiança do setor do comércio medido pela ACSP está em 99 pontos, abaixo da linha do otimismo (100 pontos).  As projeções feitas pela entidade mostram tendência aguda de desaceleração das vendas do setor.

De uma alta de 2,6%, o crescimento foi revisado pela ACSP para 1,7%.

INDÚSTRIA

A desaceleração também é forte na indústria, cujo PIB setorial recuou 0,7% no primeiro trimestre ante os últimos três meses do ano passado.

Segundo um representante da indústria que participou da reunião de avaliação da conjuntura da ACSP, problemas em mercados externos têm afetado o desempenho do setor, em especial as dificuldades econômicas enfrentadas pela Argentina, o terceiro principal parceiro comercial do Brasil.

O valor das exportações de manufaturados para a Argentina caiu praticamente pela metade (- 46,5%) considerando o acumulado entre janeiro e abril, na comparação com igual período de 2018.

Alguns segmentos industriais sentem mais os efeitos dos problemas externos e do desaquecimento da demanda interna. É este o caso da indústria de eletroeletrônicos, que recuou 7% no primeiro trimestre.

No período, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), as vendas de celulares caíram 5,6% e a de computadores, 5,7%.

Mas há alguns sinais positivos no segmento, como a alta de 15% nas vendas de materiais para instalação elétrica (conduítes, tomadas, fiação) e de 5% na linha branca. A indústria eletroeletrônica trabalha com uma alta nas vendas de 1% para este ano.

Os empresários dos diferentes setores da economia que participaram da reunião na ACSP esperam outras sinalizações do governo, além dos esforços para aprovação da reforma da Previdência, que os estimulem. Eles cobram investimentos em infraestrutura e mais medidas voltadas a simplificação de obrigações e processos.

O encontro também foi marcado pelo tributo a Renato Ticoulat Filho, ex-vice-presidente e membro vitalício do Conselho Deliberativo da ACSP,  que integrava o quadro de diretoria da entidade desde a gestão de 1982-1985, falecido em 26 de maio.

Fonte: Diário do Comércio

Deixe um comentário