Os debates que cercaram a reforma foram intensos, com fortes manifestações políticas e sociais. A polêmica se estendeu em discussões teóricas e práticas sobre o efeito da reforma na economia, nos trabalhadores e nas empresas.
De um lado, defende-se que as mudanças permitiriam maior flexibilidade e dinamismo ao mercado. De outro, acusam que se presta somente como vantagens às empresas contratantes em detrimento aos direitos conquistados pelos contratados.
Como a reforma no direito trabalhista só entrou em vigor em novembro de 2017, ainda está em um período de transição, adaptação e implementação.
Se as mudanças serão ou não benéficas à economia, empregadores ou empregados, é uma questão que apenas poderá ser mensurada a longo prazo. Cabe, agora, em 2018, saber o que de mais importante afetará diretamente o empreendedor. Confira!
Afinal, o que é Direito Trabalhista?
O Direito Trabalhista é a área jurídica que lida com as relações de trabalho e emprego entre as pessoas, usualmente entre uma empresa e um empregado. Ou seja, toda vez que se constituem relações de trabalho, essa é regida pelo Direito Trabalhista.
O Direito do Trabalho surgiu muito antes das leis que o regulam e pode ser considerado um direito do povo. As reivindicações trabalhistas como conhecemos hoje remontam à Revolução Industrial no Século XVIII, quando a produção em massa começou, especialmente na Inglaterra.
A história do Direito Trabalhista
Naquela época, não existiam leis trabalhistas que regulassem as relações entre empregadores e empregados, causando situações abusivas, trabalho infantil e muitos acidentes. Para conseguirem melhorias, os trabalhadores se organizaram em sindicatos e começaram uma longa e árdua luta.
Assim sendo, foi ao longo dos últimos séculos que os direitos dos trabalhadores foram surgindo e se adaptando às novas realidades.
No Brasil, é a Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, que rege o Direito Trabalhista. A CLT surgiu com o governo Vargas, entrando em vigor em 1943. Mesmo considerada uma legislação populista na época (e talvez ainda hoje), formou um sistema jurídico do trabalho no país.
Desde então, houve várias alterações menores. Além de muitas leis específicas que se juntaram ao rol de direitos do trabalho. Mesmo com todas essas pequenas alterações, foi em 2017 que se votou e aprovou a maior dessas reformas, que entraram em vigor em novembro daquele ano.
Quais são os problemas mais comuns enfrentados por uma empresa?
Em relação ao Direito Trabalhista, os maiores problemas enfrentados por uma empresa são sobre a estabilidade e a segurança jurídica da aplicação das leis. A CLT data de 1943. A evolução do mundo nas últimas sete décadas já a tornaram um tanto defasada e anacrônica.
Com isso, uma importante tarefa dos tribunais trabalhistas foi reinterpretar as normas do Direito do Trabalho de acordo com o contexto histórico e cultural do momento de sua aplicabilidade. Isso trouxe, é claro, muitos avanços nas relações de emprego, mas, ao mesmo tempo, criou certa instabilidade jurídica.
Isso porque a mudança de entendimento do Tribunal poderia causar um grande dano financeiro para uma empresa que, até aquele momento, seguia o que era entendido anteriormente. Um exemplo disso é a questão dos adicionais de periculosidade e insalubridade, que não eram cumuláveis e, por mudança de jurisprudência, passaram a ser.
Novas jornadas de trabalho
Outro sério problema que as empresas enfrentaram com o Direito do Trabalho era como se davam as consequências da evolução tecnológica sobre as relações de emprego. Não havia regras claras sobre o trabalho remoto, também conhecido como home office. Nem mesmo as relações com profissionais que não apresentam vínculo de emprego, mas sim de prestação de serviços, tinha definição.
A jornada de trabalho veio a ser uma questão para as empresas, por ter se tornado cada vez mais estática e engessada. A falta de flexibilidade e os métodos de controle dificultavam tanto as escalas quanto as possibilidades de melhor aproveitamento da força de trabalho.
Todas essas questões, e muitas outras, foram enfrentadas pela reforma trabalhista. Discussões à parte, o fato é que as mudanças influem fortemente na hora de empreender. Por isso o empreendedor deve ter muita atenção sobre o que está em jogo.
Quais são as mudanças que o empreendedor deve estar atento?
A reforma trabalhista foi aprovada e sancionada em julho de 2017 e entrou em vigor em novembro do mesmo ano. Os seus reais efeitos já começam a ser sentidos na economia e no mercado, especialmente com a entrada de 2018.
Foram mais de 120 pontos que sofreram mudanças decorrentes da aprovação da reforma, que afetam em maior ou menor medida o empreendedor. Cabe verificar e conhecer as mais importantes e como elas afetam o mercado. Entre essas, pode-se destacar:
Maiores possibilidades de negociação entre os sindicatos e as empresas
Com a reforma trabalhista, agora é possível que, em diversas questões, os acordos coletivos possam prevalecer sobre o legislado. Certos direitos, garantidos pela Constituição, permanecem fora do alcance da negociação.
Alterações nas normas sobre a jornada de trabalho
Na nova lei, os empregados e os empregadores poderão negociar como se dará o cumprimento da jornada de trabalho, respeitando os limites impostos pela Constituição. Com isso, espera-se que haja maior flexibilidade aos contratados para organizarem seus horários e para as empresas otimizarem o desempenho.
Negociação direta do banco de horas
Anteriormente, só poderia haver banco de horas por meio de acordo coletivo. Agora, é possível o trabalhador negociar com o empregador sobre o banco de horas, que deverá ser compensado em, no máximo, seis meses.
Novas formas de jornada de trabalho parcial
O limite do contrato de jornada parcial passou a ser de 30 horas semanais ou 26 horas mais até 6 horas extras. O trabalho parcial poderá facilitar a jornada de pais e mães de família, inclusive com a flexibilização de horários.
Diminuição do intervalo de alimentação
O período de repouso para alimentação e descanso, ou intervalo intrajornada, pode agora ser reduzido para 30 minutos. Antes a lei exigia o mínimo de uma hora. Muitos consideram que essa é uma mudança inconstitucional, visto que se trata de uma lei de saúde do trabalhador.
Tempo de trajeto por conta do empregado
O tempo de trajeto, quando o empregador fornece o transporte, ou para as empresas com localização distante, não são mais considerados como parte da jornada de trabalho. Com isso, foi extinta a categoria de horas in intinere. Esse é um dos pontos de grande controvérsia e revolta dos empregados. Assim como um dos mais defendidos pelos empregadores.
Novas formas de parcelamento de férias
As férias agora podem ser parceladas em até 3 vezes, com um período de, no mínimo, 14 dias e os outros dois com, no mínimo, 5 dias.
Grávidas e lactantes podem exercer trabalho insalubre
A reforma trabalhista agora permite que as grávidas ou lactantes exerçam funções de grau de insalubridade baixo, desde que haja laudo médico.
Categoria de trabalhadores hipersuficientes
Os empregados que possuam nível superior e salários maiores que R$11 mil reais poderão negociar individualmente com as empresas seus contratos. Respeitados os mesmos limites das negociações coletivas. Entende-se que esses funcionários possuem discernimento e capacidade para detalhar seus próprios contratos.
Prescindibilidade de registro para planos de cargos e salários
Os planos de carreira poderão ser implantados sem registro no contrato de trabalho ou homologação pelo Ministério do Trabalho. Isso permite maior flexibilidade e menor burocracia para os empregados e empresas.
Novas regras de isonomia salarial
Com o objetivo de garantir maior segurança jurídica, a reforma trabalhista exige agora que os empregados estejam há pelo menos quatro anos na empresa e dois anos na função para poder entrar com o pedido.
Novas normas sobre as comissões, gratificações e prêmios
As verbas remuneratórias eventuais por comissões, gratificações, ajudas de custo e prêmios não integram o salário, desde que limitadas a 50% da remuneração total.
Regulamentação sobre o home office
Um dos pontos de maior avanço da reforma trabalhista foi a regulamentação do home office, ou trabalho remoto. Essa forma de trabalho, com o avanço da tecnologia, tem se tornado cada vez mais comum e a lacuna da lei quanto a sua normatização já era sentida nos tribunais.
Permitividade de terceirização e transferência de atividades para pessoas jurídicas
A nova lei regulou as relações de terceirização, inclusive da atividade-fim. Assim como permitiu que os serviços fossem executados por pessoas jurídicas (PJ).
Existem diversas outras mudanças importantes e controversas dentro da reforma trabalhista, mas que atingem principalmente empresas já consolidadas no mercado. Podemos citar, dentro desse rol, a demissão de comum acordo, o fim da incorporação de função, alteração na possibilidade de concessão da gratuidade de justiça, dentre outras.
Ou seja, os pontos são muitos. Seja um empreendedor que está começando um novo negócio, ou um já experiente empresário com a empresa consolidada, cabe fazer uma revisão geral do quadro de empregados e dos contratos. Esse trabalho pode ser realizado por um advogado, atuando na advocacia preventiva.
Quais os direitos em que o negociado pode prevalecer sobre o legislado?
Uma das principais e mais controversas mudanças foi a possibilidade do negociado prevalecer sobre o legislado. Isso significa que o que foi acordado na empresa pode ser válido, independente da lei. Inclusive em situações que podem ser prejudiciais ao trabalhador. Embora isso possa significar maior flexibilidade nas negociações, teme-se que acabe por causar regressão nas conquistas trabalhistas.
Mas há limites para a negociação. Nem todos os direitos podem ser transigidos, pois, se impõe o limite dos direitos esculpidos na norma constitucional.
O empreendedor, a fim de conseguir o máximo de flexibilidade, deve estar atento ao que poderá negociar. Nesse caso, são passíveis de negociação:
- implementação e funcionamento de banco de horas, com compensação máxima em seis meses;
- a jornada de trabalho, respeitando os limites constitucionais;
- a forma de atuação e presença de representante dos colaboradores no local de trabalho;
- o funcionamento do teletrabalho, trabalho intermitente e regime de sobreaviso;
- a forma como será a remuneração por produtividade, incluindo gorjetas e prêmios;
- intervalo para almoço, sendo no mínimo de 30 minutos;
- criação de plano de cargos e salários na empresa sem necessidade de homologação pelo MTE;
- o trabalho em ambientes insalubres;
- como ocorrerá a participação nos lucros ou resultados.
O que não pode ser negociado
Por outro lado, os direitos sociais do trabalho, constantes no art. 6.º da Constituição Federal, representam os limites do que não pode ser negociado:
- o valor do 13.º salário não pode ser reduzido;
- depósito do FGTS ou valor abaixo de 8% do salário;
- um valor abaixo do salário mínimo;
- a remuneração do trabalho noturno deve ser superior à do diurno;
- o recebimento do salário-família;
- o repouso semanal remunerado do trabalhador;
- o pagamento de horas extras, com adicional de no mínimo 50%;
- o direito de tirar férias anuais, com adicional de um terço;
- o direito ao seguro-desemprego do empregado demitido;
- o aviso mínimo de 30 dias, mais 3 dias por ano de emprego;
- o período mínimo de licença-maternidade e licença-paternidade;
- o recebimento do adicional para atividades penosas, insalubres ou perigosas;
- as normas que tratem especificamente de saúde, higiene e segurança do trabalho;
- a contratação de seguro contra acidentes de trabalho quando obrigatório;
- diminuição do prazo de prescrição para ações trabalhistas;
- relativização da proibição do trabalho de menores de 16 e restrições para menores de 18;
- relativização da proibição de discriminação de pessoas com deficiência;
- relativização do direito de greve;
- o direito de liberdade de associação sindical.
Ou seja, embora a reforma trabalhista tenha permitido maior flexibilidade nas negociações de acordos coletivos, ou diretamente com os empregados hipersuficientes, reconheceu a importância dos direitos fundamentais sociais conquistados.
Quais cuidados devem ser tomados com a terceirização?
Ainda que a nova lei tenha permitido a terceirização e deixado espaço para utilização da prestação de serviço por pessoa jurídica privada de sociedade unipessoal, tomou precauções para evitar a utilização indiscriminada dessas possibilidades.
A reforma trabalhista deixou claro que não é possível demitir um colaborador CLT e recontratá-lo como PJ. Entende-se, no entanto, que haja exceção, caso os titulares ou sócios da pessoa jurídica de direito privado contratada tenham se aposentado.
Isso foi uma forma de impedir que as empresas demitissem seus empregados e os compelissem a constituírem pessoas jurídicas, a fim de recontratá-los.
O mesmo vale para a recontratação do colaborador via terceirizada, sem que haja transcorrido o prazo de 18 meses desde sua demissão.
No entanto, a discussão está longe de acabar. Muitos juízes, desembargadores e ministros das instâncias trabalhistas ainda veem o tema como, no mínimo, controverso. Assim como a mais alta corte do país, o STF.
Como evitar processos trabalhistas ao demitir um empregado?
Existem dois bons conselhos para que os empreendedores evitem processos trabalhistas ao demitir um empregado, ou mesmo quando este pede demissão: aja de acordo com a lei e seja um bom empregador.
Agir dentro da lei ficou mais fácil com a reforma trabalhista, visto que trouxe maior flexibilidade para as relações de trabalho, permitiu maior amplitude negocial e trouxe parâmetros mais concretos para as relações de emprego modernas.
Ser um bom empregador é um pouco mais complexo. No entanto, ter um ambiente de trabalho saudável, colaborativo e interessante são algumas dicas interessantes para seguir por esse caminho.
Ademais, o número de processos trabalhistas tende a cair, visto que a reforma trabalhista criou condições máximas para a concessão de justiça gratuita. Isso significa que os empregados pensarão mais antes de entrarem em aventuras judiciais, pois, podem acabar pagando custos altos no processo em caso de derrota.
Como funcionam as leis para regime de home office?
Como já dito, um dos avanços da reforma trabalhista foi normatizar sobre o home office, também chamado de teletrabalho ou trabalho remoto.
Esse regime de serviço é aquele em que o empregado não precisa estar fisicamente na empresa para realizar seu trabalho. Pode fazê-lo remotamente, em geral, de casa. Esse tipo de trabalho se torna cada vez mais utilizado, devido, especialmente, aos avanços da tecnologia de comunicação, como a internet e as redes digitais.
O regime de home office, agora, não exige mais o controle de jornada, que é muitas vezes incompatível. Ou seja, os empregados que operam em teletrabalho passam a ser controlados por produtividade, não mais por horário.
Os valores imensuráveis gastos pelo empregado em teletrabalho, como água, eletricidade e utilização de espaço, por exemplo, não são responsabilidades da empresa. Já o equipamento de infraestrutura deverá constar no contrato de trabalho, sendo que a interpretação majoritária é pela responsabilidade do empregador em fornecê-lo ou reembolsá-lo.
As discussões, no entanto, ainda são muito intensas. Inclusive sobre a forma de controle por tarefa e a existência de demanda infinita ou ainda a hipossuficiência do trabalhador na negociação deste contrato.
Quais os principais desafios do empreendedor para 2018?
Diante do novo panorama apresentado pela reforma trabalhista, 2018 será um ano para ficar atento a como essas mudanças serão consideradas pela Justiça do Trabalho nas decisões judiciais.
É importante considerar que a maior flexibilidade trabalhista atende a uma demanda atual de um mundo mais rápido, mais informado e com empregados cada vez mais autossuficientes.
A maioria dos empreendedores poderá ter alguma dificuldade na adaptação às novas regras, mas isso pode ser mais simples, ao contar com uma assessoria jurídica especializada.
Além disso, é muito importante estar atento ao mercado e a reação deste às novas regras.Como dito no começo, não é certo que a reforma trabalhista realmente seja uma solução para o empresariado.
O que você não pode ignorar
Logo, os principais desafios do empreendedor para 2018 serão em saber lidar com as novidades e com o desconhecido. Além de desbravar essas novas leis com seus próprios empregados. A mudança de regras também pode trazer uma mudança de interpretações dos tribunais.
Dos mais pessimistas que dizem que o direito do trabalho acabou, aos mais otimistas que garantem que as mudanças trarão grandes benefícios para a economia, o certo é que só com a aplicação concreta se saberá a verdade.
Em suma, o empreendedor deve, em 2018, entender o delicado equilíbrio entre ter cautela e saber aproveitar das mudanças que poderão lhe auxiliar.
O cenário no tribunal
Como falado, o Direito Trabalhista passa por um período de tensão. Os juízes trabalhistas, em sua maioria, se posicionam pela aplicabilidade da ordem mais benéfica ao trabalhador. Outros, no entanto, consideram a reforma bem-vinda, por garantir maior flexibilidade nas negociações.
Entre os advogados trabalhistas, não há quase nenhum consenso. As defesas têm sido acaloradas e os debates se estendido em todos os pontos. Um lado acusa o governo de vender os funcionários e dificultar o acesso à justiça, enquanto outros acreditam que as mudanças trarão melhorias para a relação empregado-empregador.
O que se pode ter certeza é que serão tempos de embates. Assim, para se precaver, é essencial ao empreendedor tomar cuidados importantes em relação às regras do Direito Trabalhista.
Fonte: https://saiadolugar.com.br