Independente de quem será o futuro presidente da República – se de centro, direita ou esquerda – as travas previstas em lei e as metas já estabelecidas limitam o poder do próximo governo de adotar medidas de expansão fiscal em 2019.
Segundo especialistas consultados pelo DCI, o novo ocupante da cadeira presidencial e sua equipe econômica terão que respeitar, pelo menos, cinco diretrizes básicas das contas públicas: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF); a “regra de ouro”; o teto dos gastos; o orçamento aprovado pelo Congresso no ano anterior (2018); e a meta de inflação, de 4,25%, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Vale a ressalva de que o presidente eleito, desde de que com votos e apoio no Congresso Nacional, poderá alterar essa legislação para uma versão mais flexível, sobretudo com efeitos mais claros a partir de 2020.
“Não vamos nos enganar, se o atual governo Temer é impopular, vem aí um mandato de linha menos ortodoxo que buscará alguma flexibilização fiscal. Mas, para isso, terá que ser muito conciliador com o Congresso, que olhará para o legislativo como aliado. É saudável esse debate”, argumenta o professor da Trevisan Escola de Negócios, Walter Franco Lopes.
“No melhor dos cenários – se o próximo governo for comprometido com a responsabilidade fiscal – a dívida pública deve atingir 90% do PIB em três anos [em 2021] por causa da inércia dos déficits. Não há solução fácil, ou se vai pelo caminho virtuoso e responsável, ou reencontramos com a inflação”, diz o professor de economia do Insper, João Luiz Mascolo.
O patamar de 90% da relação dívida/PIB é considerado como crítico, pois investidores poderiam considerar que é muito arriscado emprestar recursos para um País emergente. “Se chegarmos em 2021 com um programa fiscal crível, teremos uma chance. Caso contrário, pode dar tudo errado”, alerta.
Dados do Banco Central divulgados na última sexta-feira (29/06) mostraram que a dívida bruta do governo geral havia subido de 74% do PIB em dezembro de 2017, para 77% do PIB em maio de 2018. “São três pontos percentuais em apenas cinco meses”, alerta Mascolo sobre a deterioração do indicador.
Na visão do coordenador de projetos de finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA), Roy Martelanc, o próximo presidente da República precisará de credibilidade logo no início do mandato para manter as contas em ordem.
“A economia não está aquecida. Se não passar credibilidade, os empresários param de investir e as pessoas param de consumir, e o País entra em outra recessão”, avisa. O professor aponta que os desafios são conhecidos da sociedade: aprovar a reforma da previdência; simplificar o regime tributário; reduzir a burocracia para negócios. “É só não fazer nenhuma manobra estranha, nenhuma mudança brusca. O empresariado quer investir, tem uma montanha de capital parado esperando; as pessoas querem consumir”, argumentou.
Em outras palavras, com confiança, a roda da economia volta a girar, mais investimentos, empregos, renda e consumo, e o consequente aumento da arrecadação ajuda nas contas públicas.
Martelanc avisa que por causa da alta dos juros nos Estados Unidos, 2019 também será desafiador. “O dólar se fortelece em relação às demais moedas, com reflexos no real e nos preços das commodities”, diz. Mas, se o País souber aproveitar a desvalorização do real com a expansão das exportações, isso gerará produção e empregos.
Na opinião de Lopes, o caminho será propício para mais privatizações e concessões de infraestrutura nas áreas de energia, saneamento, rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. “Precisa jogar uma dose de otimismo [com as privatizações], e talvez deixar o câmbio flutuar um pouco mais”, diz. Nesse ambiente, um real desvalorizado, mas com a inflação doméstica controlada, pode incentivar as exportações do País.
O professor de administração da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), João Paulo Vergueiro, também reforça que o próximo governo terá que adotar uma postura de responsabilidade com as contas públicas e fazer a gestão do orçamento num ambiente de economia ainda desaquecida. Na opinião dele, seria um erro, elevar os impostos.
“É muito comum – governantes em início de mandato – aumentarem os impostos. Mas, essa solução de curto prazo é muito impopular”, comenta Vergueiro.
Ele sugere que o presidente tenha um perfil conciliador para trazer o Congresso e a sociedade para o debate na busca de soluções. “Pela Lei de Responsabilidade Fiscal, [diante da situação das contas], não se poderá reajustar salários dos servidores, nem contratar pessoal”, lembra.
Para gerar crescimento, Vergueiro recomenda o mapeamento de setores da economia com potencial. “Incentivos para startups; turismo, pois gera trabalho e renda; concessões de infraestrutura; e a desburocratização dos processos para abrir empresas”, cita o professor.
O professor de economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Agostinho Pascalicchio, observou que, até o momento, nenhum dos pré-candidatos à Presidência apresentou um plano econômico voltado para o longo prazo. “Tem que se evitar qualquer bolha de consumo como a ocorrida entre 2010 a 2013, uma saída populista será ineficiente”, argumenta Pascalicchio.
Ele também reitera que 2019 será mais um ano de volatilidade no cenário internacional. “Com encarecimento das importações, das commodities. O preço do nosso café da manhã ficará mais caro [por causa do trigo no pão], assim como dos combustíveis”, prevê. Nessa situação, o novo governo terá que manter-se severo no ajuste e cumprir as metas. “Ou veremos mais aumento de impostos específicos sobre energia e combustíveis, e uma inflação maior em tarifas, nos preços administrados”, adverte. Entre os caminhos para superarmos o drama fiscal, Pascalicchio fala do desenvolvimento da infraestrutura (concessões), e da indústria de bens intermediários (químicos e petroquímicos).
Regra de Ouro
Além de obedecer a LRF, cujo descumprimento é passível de pedido de impeachment do presidente (vide o caso Dilma Rousseff em 2016), outra coisa que preocupa qualquer equipe econômica é a preservação da chamada “regra de ouro”, das contas públicas, com penas severas aos responsáveis.
A economista e professora do UniDrummond, Nilza Santos Siqueira explica que a regra de ouro está prevista na Constituição Federal desde 1988 e institui que as operações de crédito da União não podem ser maiores que os investimentos. “Isso impede que o governo emita títulos da dívida pública para pagar gastos correntes, como salários e despesas outras dos órgãos públicos”, diz.
Segundo cálculos do próprio Tesouro Nacional divulgados na última quinta-feira (28/06), o equilíbrio da regra de ouro em 2019 exigirá ajustes de R$ 260,2 bilhões. Em 2018, o Tesouro diminuiu esse desequilíbrio com recursos do BNDES, do Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND) e do Fundo Soberano.
Fonte: DCI