A importância do compliance na área de saúde


De tempos em tempos, novos termos são incorporados ao mundo empresarial, normalmente trazidos de experiências estrangeiras. Agora, um termo em voga é o compliance, que vem do verbo inglêsto comply, que significa seguir as regras. Assim, os departamentos de compliance das empresas dedicam-se a compilar as regras que se aplicam aos negócios e monitorar sua aplicação.
 
 
O setor de saúde também não poderia deixar de incorporar o compliance na gestão das suas atividades. As atividades de saúde, desde as mais simples realizadas dentro de um consultório médico, até as mais complexas desenvolvidas em um hospital geral, envolvem uma série de riscos que, com a gestão adequada, podem ser minimizados ou até eliminados.
 
 
 
As indenizações altas a que os médicos e hospitais vêm sendo condenados que, muitas vezes, decorrem unicamente da má gestão de riscos que poderiam ter sido evitados, pode chegar a inviabilizar a atividade, sem falar na mácula moral impingida aos profissionais envolvidos. Por este motivo, cada vez mais os profissionais e instituições que desenvolvem atividades ligadas à saúde tem buscado orientação para gerenciar adequadamente os riscos das operações.
 
Um dos documentos mais importantes na atividade de saúde é o prontuário médico. A falta deste documento ou a falha nos registros podem significar a diferença para o sucesso de uma ação judicial. No prontuário, o médico deve anotar com o maior detalhamento possível todo o atendimento prestado ao paciente, desde a anamnese, passando pelas queixas e sintomas, achados no exame clínico, conclusões diagnósticas, orientações dadas ao paciente e prescrições.
 
As observações pessoais do médico em relação ao paciente também devem ser anotadas no prontuário, especialmente se o paciente for de difícil manejo, resistente às orientações. Os registros do prontuário durante um internamento ou um procedimento cirúrgico devem conter todas as intercorrências, sem desprezar nenhuma circunstância, por menores que possam parecer. Tudo deve ser registrado.
 
O prontuário médico é um documento que pertence ao paciente e é tutelado pela lei, que lhe garante o sigilo. Entretanto, a guarda do prontuário cabe ao estabelecimento de saúde que prestou atendimento ao paciente, no caso, as clínicas, consultórios e hospitais.
 
Numa eventual ação em que se alegue suposto erro profissional, inclusive com pedido de condenação da instituição hospitalar, o prontuário médico corretamente registrado será prova crucial apta a demonstrar a conduta, sendo documento essencial também para a realização da prova pericial. Isso sem falar que a displicência nos registros e arquivamento do prontuário, por si, já pode levar o julgador a entender pela negligência do estabelecimento ou do próprio profissional. Isso inclui o uso de letra legível, quando o prontuário não for eletrônico.
 
Ao mesmo tempo, uma instituição de médio ou grande porte deve contar com uma ouvidoria. Muitas situações podem ser resolvidas por meio destes departamentos e demonstram sempre a boa vontade da instituição em receber o feedback dos seus pacientes e promover adequações nos seus serviços. Além de ser um excelente canal para solução amigável de conflitos que poderiam desembocar no Poder Judiciário. A ouvidoria pode funcionar, ainda, como um canal para os próprios funcionários registrarem falhas observadas.
 
 
Estudos já demonstraram que, quanto melhor a relação médico-paciente, menores são as chances do paciente processar o profissional em razão do vínculo de confiança estabelecido. Isso significa que o paciente deve ser esclarecido acerca de todos os riscos inerentes ao procedimento ou tratamento ao qual vai se submeter, se há outras opções terapêuticas e são quais os respectivos riscos. O paciente tem direito a todas as informações de forma clara e em linguagem acessível, evitando-se termos técnicos e formulários padronizados.
 
O juiz, ao confirmar que o paciente foi devidamente esclarecido dos riscos a que se expôs e que, mesmo assim, consentiu em submeter-se ao tratamento, dificilmente condenará um profissional ou uma instituição pela ocorrência de uma intercorrência esperada não decorrente de negligência, imprudência ou imperícia.
 
Como se viu, há muitas variáveis no cotidiano de uma instituição de saúde que podem determinar o sucesso ou o fracasso de uma defesa judicial, de forma que a adequada gestão das rotinas poderá minimizar os motivos que levam os pacientes a buscar a tutela judicial ou, caso não impeça, torne bem sucedida a defesa processual.
 
Artigo por Melissa Kanda – Advogada especializada em Direito Médico e à Saúde, atuando no setor há 15 anos.
 
 
Fonte: Gazeta do Povo
 

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